29.5.09

Sem tempo para pensar

O título do livro é suficientemente estimulante para nos despertar a curiosidade: No Time to Think: The Menace of Media Speed and the 24-Hour News Cycle. Como todos os livros que se metem com os média e com os jornalistas, está a dar grande polémica nos EUA. E ainda bem.

A tese dos autores, dois norte-americanos, Charles Feldman e Howard Rosenberg (este já ganhou um prémio Pulitzer), pode não ser nova, mas não peca por falta de pontaria: os média estão a andar cada vez mais depressa e não conseguem parar para pensar no que estão a fazer.

Feldman e Rosenberg, ambos jornalistas veteranos, apontam factores, resumidos por Elisabete de Sá, no Jornal de Negócios, de agravamento do estado de coisas, no qual as tecnologias desempenham também o seu papel:

  • a velocidade crescente com que os média processam informação
  • a voracidade com que correm ao minuto atrás de rumores em blogues e no Twitter e os replicam sem confirmar a autenticidade dos factos
  • a crescente pressão para fazer cada vez mais e mais rápido
  • o sensacionalismo fácil que vende apenas soundbytes a troco de audiências
Tudo isto é conhecido há muito, tem custos pesados para a qualidade e credibilidade do jornalismo, e há muito que é olimpicamente ignorado pela generalidade dos média noticiosos. Por isso, convém que, de vez em quando, haja quem esteja disposto a dizer que o rei, se não vai nu, segue cada vez com menos roupa.


A ler:
É o jornalismo "bang bang: um tiro e já está
Blogue de No Time to Think

27.5.09

O editor de redes sociais

Os caminhos do ciberjornalismo cruzam-se, cada vez mais, com os das redes sociais, que conhecem hoje uma expansão acelerada. No caso do Twitter, dir-se-ia mesmo exagerada. Sinal evidente deste cruzamento chega-nos do New York Times.

O diário nova-iorquino decidiu criar um novo cargo, o de editor de "social media". Jennifer Preston será a estreante. Que faz um editor de redes sociais?: «It’s someone who concentrates full-time on expanding the use of social media networks and publishing platforms to improve New York Times journalism and deliver it to readers.»

Jennifer vai trabalhar de perto com editores, repórteres, bloguistas e outros de modo a potenciar o uso de ferramentas sociais para encontrar fontes, identificar tendências e recolher informações. Mais importante, espera-se que ela ajude o jornal a envolver uma audiência que anda espalhada pelos Twitter, Facebook, Youtube, Flickr, Digg, entre outros.

A ideia, como é fácil de ver, não é nada má. Dito de outro modo: em tempos de crise, a necessidade aguça o engenho.

8.5.09

"i" assim não compro

Em plena crise - económica, publicitária, de vendas - temos um novo diário. É de saudar a coragem do grupo Lena, que veio criar dezenas de novos postos de trabalho e mexer, sobretudo em Lisboa, com o depauperado mercado de emprego jornalístico. Há algo de kamikase neste projecto. O que não é necessariamente mau. Mas algumas dúvidas se colocam:

  • Para leitores, como é o meu caso, que vêm do tempo dos enormes jornais broadsheet, o "i" parece mais um suplemento do que um jornal propriamente dito.
  • A organização do conteúdo, não por secções tradicionais, mas com rótulos como Zoom ou Radar, podem parecer modernos, mas não parece que ajudem muito os leitores a situar-se nos temas.
  • Ao folhear os primeiros números do novo jornal, tive a mesma sensação de quando folheei as primeiras edições do Sol. E passo a recordar: «A edição de hoje do Sol folheia-se em cinco minutos. Não se pára em nenhum apeadeiro porque não aparece nada verdadeiramente estimulante para ler. No caderno principal, não há 'notícias duras'.» Déjà vu. Como fazer a diferença sem fazer a diferença pelo lado certo, o do jornalismo?
  • Que leitores conseguirá o "i" captar e fidelizar? Irá roubar leitores ao Público? Mesmo estando em baixo de forma, o diário da Sonae pode dormir descansado. Aos jornais de economia? Pouco provável. Irá, então, conseguir descobrir a fórmula, que tantos perseguem, de pôr a rapaziada dos 18 aos 25 a ler jornais? É que uma "audiência qualitativa", como a que o director da publicação quer, é muito difícil de conquistar. O suplemento do New York Times também aqui não irá fazer milagres.
  • Para quem está a começar, isso de não sair ao domingo tem algo de suicida...
  • O "i", ao que tudo indica, será mais um jornal para alimentar sobretudo as fontes, os newsmakers, os colunistas, os comentadores, as realidades de Lisboa. Tal como acontece com a maior parte dos diários e dos restantes média generalistas.
  • O grafismo do jornal não é, do meu ponto de vista, o mais estimulante ou arrojado para um projecto nado e criado em 2009.
  • O site do jornal, bom, é mais um site de um jornal de papel a juntar a tantos outros.

Como eu gostava de não escrever estas coisas sempre que sai um jornal e um site de um jornal neste país. Não obstante, desejo as maiores felicidades a toda a equipa do "i" . O nascimento de um jornal é sempre um grande acontecimento em qualquer democracia.